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quarta-feira, janeiro 25, 2012

Pórtico para Fantásmia




Não conseguiria dizer quanto tempo passara de pé, imobilizado diante do
pórtico, com a maresia a adocicar-lhe a respiração, a ouvir o som do vaivém das
ondas como um metrónomo a marcar o ritmo à grande melodia cósmica. O tempo
parecera imobilizar-se consigo. O dia transfigurara-se em noite, sem que desse
por isso. As luzes da povoação lá em baixo iluminavam espectralmente os céus.
Da ancestral igreja restavam apenas ruínas. Ruínas duma ruína, pois o pórtico
era bem mais antigo do que as paredes que se esboroavam pelo chão. Várias
religiões haviam feito daquele lugar de culto para diferentes divindades.
Sentiu a pele arrepiar-se ao pensar em todos aqueles, sangue do seu sangue, que
se teriam ao longo de incontáveis eras apresentado solenemente perante aquela venerável
arcada. Sabia que todos haviam regressado de cabeça baixa e ombros descaídos.
Gerações de candidatos que haviam falhado a passagem. Seria a suprema vergonha
ver-se obrigado a perpetuar o nome da sua família, gerando um filho que um dia
se apresentasse também diante daquele arco imemorial. Todos os outros clãs
haviam já abandonado esta terra, apenas a sua heráldica não conseguira ainda
empreender a grande travessia. Não se despedira nem do pai nem do avô, não
toleraria ver a esperança a brilhar-lhes nos olhos. Fitou as desgastadas pedras
até finalmente distinguir o reflexo da fosforescência do brilho de Fantásmia.
Só então avançou de passo firme, ficando encadeado com a luz envolvente.
Percorreu-o uma estranha sensação de calma e tranquilidade. Uma serenidade como
nunca antes sentira relaxou-lhe o corpo dos pés à cabeça. Ainda cego pelo
brilho das estrelas, ouviu uma voz sábia dizer "Bem-vindo a casa."

1 comentário:

Passageiro do Tempo disse...

WOW! Grande foto e fabuloso texto... o resto é imaginar-nos do lado de lá... ;)

Um grande abraço!

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