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Uma viagem conduzida por:

quinta-feira, julho 10, 2014

Saudade na Cidade Branca



"A pouco e pouco o Luar te veio buscar...
E viajas... lentamente... na melodia da noite...
São tão subtis os momentos de saudade que guardas em ti...
Que dos sonhos não os sabes distinguir.
E a cidade branca... como lhe chamaste um dia, não pára...
Por onde viaja a tua Alma?
Que poemas nascem em ti? Habito a tua saudade?"



2 comentários:

Oscar Mourave disse...

"As cidades e a memória - 4

Ao se transporem seis rios e três cadeias de montanhas, surge Zora, cidade que quem viu uma vez nunca mais consegue esquecer. Mas não porque deixe, como outras cidades memoráveis, uma imagem extraordinária nas recordações. Zora tem a propriedade de permanecer na memória ponto por ponto, na sucessão das ruas e das casas ao longo das ruas e das portas e janelas das casas, apesar de não demonstrar particular beleza ou raridade. O seu segredo é o modo pelo qual o olhar percorre as figuras que se sucedem como uma partitura musical da qual não se pode modificar ou deslocar nenhuma nota.

Quem sabe de cor como é feita Zora, à noite, quando não consegue dormir, imagina caminhar por suas ruas e recorda a seqüência em que se sucedem o relógio de ramos, a tenda listrada do barbeiro, o esguicho de nove borrifos, a torre de vidro do astrônomo, o quiosque do vendedor de melancias, a estátua do eremita e do leão, o banho turco, o café da esquina, a travessa que leva ao porto.

Essa cidade que não se elimina da cabeça é como uma armadura ou um retículo em cujos espaços cada um pode colocar as coisas que deseja recordar: nomes de homens ilustres, virtudes, números, classificações vegetais e minerais, datas de batalhas, constelações, partes do discurso. Entre cada noção e cada ponto do itinerário pode-se estabelecer uma relação de afinidades ou de contrastes que sirva de evocação à memória. De modo que os homens mais sábios do mundo são os que conhecem Zora de cor.

Mas foi inútil a minha viagem para visitar a cidade: obrigada a permanecer imóvel e imutável para facilitar a memorização, Zora definhou, desfez-se e sumiu. Foi esquecida pelo mundo. "

In: "As cidades invisíveis" de Italo Calvino.

A. M. Catarino disse...

bela como uma miragem ;-) aquele abraço

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