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Uma viagem conduzida por:

quarta-feira, outubro 10, 2007

Terra de Ninguém

Querem saber porque é que eu vendi a minha casa e comprei uma autocaravana? Não é segredo, não o escondo de ninguém. Espero até que a minha história vos possa ser de alguma utilidade.

Eu trabalho em três lugares diferentes. Não vou dizer os nomes, adiantarei apenas as distâncias a que ficavam da minha antiga casa: 21 kms, 30 kms e 50 kms. Estas eram as coordenadas mágicas duma pirâmide imaginária que tinha como coração (um hipotético centro geográfico) o meu lar, herança dos meus pais que viviam apenas já na minha memória. Muitos eram os dias em que tinha de percorrer os três vértices da pirâmide que me pagava as contas: estava de manhã a 50 kms, à tarde a 21 kms e de noite a 30 kms. No início não me incomodava muito este périplo ...recordo que me regojizava até por ter o que me impedisse de ter pensamentos menos felizes ao longo do dia. Porém, certa vez olhei-me ao espelho retrovisor do meu carro e apercebi-me de que já não tinha 20 anos... Ao entardecer quando regressava dos 30 kms surgia a inesperada dúvida se percorrera aquele mesmo caminho naquela manhã ou na manhã de ontem ou anteontem... Apossava-se de mim um intrigante sentido de desorientação e inquietação... Os dias deixaram de parecer compridos para serem sempre o mesmo dia... continua e initerruptamente...

A páginas tantas a minha casa não era mais do que um lugar aonde eu ia dormir. Quantas vezes não percorria eu os 30 kms apenas para regressar outros 30 kms poucas horas depois? Que sentido tinha perder meia hora para um lado e para o outro se podia beneficiar muito mais dessa hora se me deitasse imediatamente? Quantas noites praticamente não adormeci com as mãos sobre o volante e não acordei com um arrepio na espinha?

Não lamento o que fiz... não me arrependo de ter cortado as raízes que me prendiam ao meu passado pessoal e familiar: não sei se isto é a liberdade, mas os meus valores, os meus ideais, a minha bandeira e a minha história são hoje a sombra da árvore que me abriga...

5 comentários:

Marisa Fernandes disse...

Chama-se a isso bem-estar e qualidade de vida. Foi uma decisão corajosa...
Esse passado, essas raízes continuaram a existir... na Memória de quem as recorda. Portanto, jamais esse gesto ou decisão representará um corte com o passado!
Beijo*

Passageiro do Tempo disse...

A tua casa é onde tu queres... e as recordações viajam contigo... sempre...
Apoio a tua escolha... qualquer que fosse... claro!!!:)

Grande abraço!!

Luís Filipe C.T.Coutinho disse...

somos o coração do espaço que ocupamos, não é o espaço que define por inteiro a pessoa que somos

abraço

Anónimo disse...

Comovida...
Já fiz o mesmo que tu...
Mas nao eram as distancias q me incomodavam...
Prometo voltar, para contar o resto da história.
Até lá.....

Anónimo disse...

Prometi que voltaria para contar o resto da minha história:
Adoro o teu texto, já o li vezes sem conta...
... a minha história, essa, vai ficar para mais tarde... pois, ainda não acabou.
Grata

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